segunda-feira, 23 de abril de 2012

José Alves de Oliveira

RESENHA

TRÂNSITO RELIGIOSO - DA OBRA DE RICARDO BITUN IGREJA MUNDIAL DO PODER DE DEUS: RUPTURAS E CONTINUIDADES NO CAMPO RELIGIOSO NEOPENTECOSTAL


Resenha sobre o terceiro capítulo intitulado Trânsito Religioso da obra de Ricardo Bitun: Igreja Mundial do Poder de Deus – Rupturas e Continuidades no Campo Religioso Neopentecostal, apresentado à Faculdade Teológica Batista de São Paulo, curso de Pós Graduação, Prof. Marcelo Santos.



São Paulo 2012

O trânsito religioso

De acordo com a primeira parte do texto onde o autor sintetiza os motivos prováveis, que causam o fenômeno do trânsito religioso, podemos observar que, esse trânsito ocorre por causa de uma busca individualizada da parte do fiel em conjunto com o oferecimento por parte das instituições religiosas de bens de consumo simbolicamente religiosos. E este trânsito tem ocorrido com mais intensidade no movimento protestante e, de uma forma mais aguda nos seguimentos pentecostais e neopentecostais, enfaticamente nas três maiores representantes do neopentecostalismo brasileiro, são elas; igreja Mundial do Poder de Deus, igreja Internacional da Graça e Universal do Reino de Deus. Sendo que a igreja Mundial do Poder de Deus nasceu a partir de uma cissiparidade da igreja universal que desde então tem perdido muitos fiéis para a igreja mundial com  sua estratégia mercadológica de oferecer a promessa de cura divina e uma vida de plena prosperidade tanto material quanto espiritual.                                                                                                              A analise desse fenômeno denominado de “trânsito religioso” é feita pelo autor, com base critica no “processo de secularização”, conceito do sociólogo Max Weber, que afirmou que esse processo tomaria o lugar da religião como estrutura ideológica de explicar e conceber o mundo, dando lugar a visão racionalizada da vida, que seria na verdade o desencantamento do mundo. Esse processo de secularização atingiu em cheio o campo religioso, porem não ao ponto de extingui-la, mas sim a forçando a fazer adequações para não conflitar com a modernidade racionalista. Assim a religião foi obrigada a dar novos significados a sua existência e, criar novos símbolos sagrados que pudessem suprir as demandas existentes na vida dos clientes.    Pesquisadores baseados nas categorias Weberianas analisaram em 1960, o crescimento do pentecostalismo ocorrido nas periferias com um “fôlego tímido” do seguimento nestas áreas e, que logo sucumbira à secularização, porem não foi o que aconteceu. Ao contrario, muitos pesquisadores tiveram que voltar atrás em suas analises, tendo que levar mais a serio o crescimento do seguimento pentecostal. Por esta causa há uma disputa de teorias de grupos de pesquisadores que divergem nas opiniões; de um lado um grupo afirma que, o que esta acontecendo é um fenômeno inverso ao processo de secularização, ou seja, um “reencantamento do mundo”, enquanto que do outro lado há o grupo dos que afirmam que a própria “mobilidade religiosa”, ou melhor o “trânsito religioso” só vem confirmar com mais força o “processo de secularização”.                                                                                                               Assim, a despeito das disputas de opinião, o seguimento neopentecostal cresce e decresce, tendo como seu maior expoente atual, a igreja Mundial do Poder de Deus, ao contrario de sucumbir ao racionalismo moderno, faz uso do cientificismo-técnico (mídias), com o objetivo de diversificar as ofertas de bens de consumo religiosos, ao ponto de paradoxalmente, mesmo sem intensão definida, sacralizar o secular e secularizar o sagrado, ao bel prazer de seus clientes religiosos, ou seja, os consumidores do sagrado. O autor quer nos fazer entender que, com o advento da modernidade a ênfase na individualidade se tornou cada vez maior, consequentemente essa individualização também afetou a relação tradicional do fiel com a instituição religiosa, que migrou de um fidelismo religioso para um nomadismo religioso, ou seja, o individuo não tem mais compromisso sério e definido com a instituição religiosa seja ela qual for, porém adere de forma descompromissada a religião que melhor lhe ofereça os bens de consumo, de forma a suprir sua necessidades individuais. Até esse ponto, o que podemos entender que a religião para atender as demandas do homem moderno, incorporou uma logica de mercado, do consumo, reproduzindo em certo grau refletidamente o modelo capitalista da sociedade moderna. O pior disso tudo é que as igrejas citadas no começo do texto incorporaram de tal forma o modelo capitalista, assim como há concorrência e competição das empresas, multinacional e marcas de grife que disputam entre si por consumidores cada vez mais ávidos por seus produtos. Da mesma forma estas igrejas produzem incessantemente bens religiosos com a intenção de angariar cada vez mais o maior numero de consumidores do sagrado.                 Essa produção de bens de consumo religioso leva as mesmas instituições religiosas a uma disputa continua pelos clientes, buscando a hegemonia da produção   simbólico-religiosa. Numa sociedade marcada pela superficialidade em todos os sentidos, troca-se de igreja como se troca de roupa, fenômeno este que segundo os pesquisadores Camurça, Prandi e Pierucci, é característica de uma sociedade de mudanças rápidas, pluralidade cultural e uma acentuada liberdade de expressão, principalmente no que diz respeito a escolha da religião. Bitun nos faz enxergar por meio de testemunhos coletados de fieis da igreja Mundial do Poder de Deus, a acentuação do processo de secularização visivelmente perceptível por meio do trânsito religioso. Fica patente nos testemunhos a individualização da escolha, o livre arbítrio na hora de decidir por qual igreja frequentar, levando sempre em consideração a que melhor suprir as necessidades pessoais. O que também devemos perceber é que numa sociedade desigual, racista, com precário sistema de saúde, adicionado aos sofrimentos físicos, psicológicos e sociais os indivíduos tornam-se vulneráveis aos apelos de lideres como os do bispo Waldomiro, que apela com promessas de solução para todos os problemas, desde a cura divina até uma vida prospera e feliz. A magicizaçao do sagrado juntamente com sua manipulação é comprovada pelos jargões contidos em envelopes de dízimos e ofertas, site, jornais e revistas com as frases do tipo: “dupla honra”, “a força de Deus”, “a mão de Deus esta aqui”, e por ai vai. Segundo Bitun, essas pessoas sucumbem a tais apelos por estarem vivendo em situações limite, sendo  aliciadas, seduzidas pelas promessas de conquista de uma vida melhor. Podemos constatar a partir do texto de Bitun, que o trânsito intra-religioso ocorre com maior intensidade entre as igrejas neopentecostais, pois são estas que competem entre si na produção e manipulação da oferta do sagrado.                                                                    Assim, como é possível observar através dos testemunhos, as pessoas transitam de uma igreja para outra de acordo com suas demandas pessoais, concomitantemente a melhor oferta feita por tais igrejas. Além da livre escolha pela igreja que melhor represente os interesses do individuo, há também a ausência de obrigação, de compromisso para com a igreja, facilitando assim o trânsito de uma igreja a outra sem constrangimento ou culpa. A escolha pela igreja Mundial do Poder de Deus se dá segundo os testemunhos, a partir dos resultados alcançados pelos fieis, mesmo que tais resultados não sejam uma realidade para todos os que frequentam. Porem a estratégia da igreja em usar a mídia televisiva para catapultar os resultados aparente de cura e prosperidade, está  na base do sucesso da igreja, pois tal propaganda atrai a turba sedenta por alivio imediato. Outro fator que contribui para isso é, a ênfase na liderança carismática do Bispo Valdomiro que parece possuir um poder psicossocial tremendo sobre a massa, fazemdo com que muitos se identifiquem com ele e sua indústria de promessas.                                                          A ênfase nos resultados obtidos pela igreja é o carro feche da produção de bens religiosos como a propaganda-mor da igreja. É também o argumento para contrapor todo o fracasso dos fieis em conseguir tais benefícios em outras igrejas, ou até mesmo na instituição governamental. A igreja Mundial não tem a intenção de gerar pessoas compromissadas, convertidas a Cristo, mas sim adeptos dos resultados, dos milagres, da cura divina e das promessas de uma vida feliz. Neste ponto é necessário lembrar que o trânsito religioso acontece em dois níveis: Inter- religioso, que é um trânsito mais amplo que ocorre de uma religião a outra como, budismo para o catolicismo, catolicismo para o umbandismo, umbandismo para o protestantismo, protestantismo para o kardecismo, isto é só um exemplo. Intrareligioso, é um trânsito que ocorre dentro de um mesmo movimento religioso, como por exemplo, o trânsito que acontece nos seguimentos protestantes e, que de forma mais acentuada torna-se visível no seguimento neopentecostal, principalmente nas igrejas, Internacional da Graça, Universal do Reino de Deus, Mundial do poder de Deus, como seus maiores representantes.

A conversão protestante
Conversão X Adesão

Até aqui temos discorrido sobre o trânsito religioso, porem agora vamos descrever as consequências desse fenômeno no que diz respeito a conversão do mundo para Cristo na tradição protestante, em oposição a adesão do individuo que se encontra numa estado doentio tanto de mente, quanto de corpo converte-se a cura prometida, neste caso, pelo líder da igreja Mundial do Poder de Deus Waldomiro, que acaba sendo mais enfatizado do que o próprio Cristo. Tradicionalmente “conversão” no sentido protestante da palavra, é o processo pelo qual o individuo passa a partir do momento em que entra em contato com uma nova “religião”, aceita a “visão de mundo” que a mesma lhe oferece ou lhe impõe, internalizando seu sistema de crença e valores.                        O modelo de conversão protestante acontece num processo de: arrependimento seguido da confissão de pecado, batismo e a agregação à igreja, como membro que deve ter compromisso fiel e duradouro com a mesma e seu senhor. Porém o autor nos alerta sobre a diferença que existe entre conversão, recrutamento e comprometimento, pois segundo Robbins há muita confusão em relação aos temos. Mas para nós a importância desses termos reside na intenção que autor pretende, de contrapor o conceito de conversão historicamente protestante, ao conceito de mera adesão a algum grupo religioso por motivações baseadas em suprir necessidades pessoais. Apesar de que o autor deixa claro que exista uma diferença do conceito de “conversão” do protestante histórico e do protestante pentecostal.                                         Segundo o autor tais diferenciações são importantes para se entender a mudança, a passagem do conceito e pratica da conversão cristã tradicional para o tipo de conversão neopentecostal. Segundo o texto a primeira enfatiza a nova vida com Cristo que é preconizada por uma mudança radical de valores, comportamentos, negação do mundo e, principalmente, compromisso com a igreja. A conversão pentecostal apela por sua vez de forma enfática as emoções, experiências dramáticas que tem como ápice “aceitar a Jesus”.       Enfim, o autor acabou constatando a partir de observações feitas nos cultos da igreja Mundial do Poder de Deus, que o rito da conversão desapareceu. Além desse afastamento da igreja Mundial do Poder de Deus, também a troca na ênfase, que deixa de ser a confissão publica de Cristo e compromisso com a igreja, agora foi totalmente substituída pela oferta, não mas de Jesus, mas sim da cura divina, a busca não é mais pelo Senhor dos milagres, mas pelos meios dos milagres e dos milagreiros em si. Desta forma temos então uma indústria de promessas avida por novos consumidores. Há uma pergunta a se fazer? O trânsito religioso ocorre somente pela oferta de cura divina, ou qualquer outro bem de consumo religioso? O autor responde que não! Pois este trânsito também é fruto de um processo de re-siguinificaçao especifica das crenças religiosas que, assim como quando começamos nosso dialogo sobre o processo de secularização, isto também é em suma a reação das religiões a esse processo, hora rompendo com ele, hora lhe dando continuidade, num processo paradoxal, ou melhor dialético.

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